Projeto para uma
Apostila de Fundamentos para um B-Boy
Autores:
Marcio Moraes - B-Boy Moraes
Alexandre W. de O. Santos - Poeta Xandu
Sumário – para o dia 19 Nov / quarta:
I - Introdução ao universo do B-Boy.
Autor:
Alexandre W. de O. Santos - Poeta Xandu
A Lapa fervia naquela noite. O trânsito totalmente parado. Os táxis estacionavam em fila dupla e engarrafava ainda mais. Estavam lá, esperando na saída dos restaurantes, para aproveitar a freguesia. Nos ônibus, os passageiros mais impacientes saltavam, para continuar a viagem, indo a pé pra casa. Nos carros, o som no talo e para alguns a carona rendeu: cinco sentados e uma menina acabou indo no colo mesmo. Nas calçadas, um montão de barracas, esteiras espalhadas, rádios no volume máximo. No ar, cheiros de queijo coalho, acarajé, milho, xis-tudo, cachorro ou churrasquinho de gato. Discos antigos eram relíquias vendidas, bijuterias eram o mesmo que jóias. Era o povo pondo banca de camelô, para faturar algum. A noite é comércio. A multidão já não cabia nas calçadas, invadia a pista, ziguezagueava entre os carros parados. São os consumidores, uns com grana, outros sem qualquer tostão.
Entre os milhares de passantes, alguns, mal intencionados, buscavam sua próxima vítima. Ninguém diz, até porque ladrão não tem cara nem jeito. A polícia ali, na vigília também. Nos bares, um burburinho contínuo, cerveja a balde e conversas da vida, amores, traições e repertório de piadas novas para contar. Boites? De todos os tipos! Neste dia até os moderninhos ajeitaram seu canto, com música industrial eletrônica. Tinha forró, discoteque, rock e muito funk, muito samba como sempre. O requebrado da morena, o cabeludo em ataque de epilepsia – a dança contagia e convida para o amor. Tudo que é bom acaba. Certa hora, quem é de beber já está bêbado, quem é de dança está esgotado, quem é de namorar já namorou bastante. A noite tem vida interna, nasce e morre, como tudo.
Depois das três da manhã, o clima de fim de festa toma forma. As calçadas começam a se esvaziarem. Porém, na casa de funk, a troca de DJ’s anuncia um novo climax. Palmas, gritos, uma roda se abre. Uma rapaziada se adianta, correndo entre os carros, atravessando as ruas, em meio a multidão. Surgem do nada. Casaco adidas, moleton, boné de aba reta. Invadem a pista de dança, de um baile sem porteiro, de entrada vazada e grátis. Nada mais popular, baixa renda. A casa, muito estreita, apertada, mas para espanto geral, aquela dança ganhou espaço e era incrível – era a roda dos B-Boys!
Parecia briga. Aquela turba toda, estilo gueto-boy, gente mal-encarada, correndo pelas ruas. Um passo pra trás, sinal de cautela... Um tempo para perceber. Assim que eles entraram, o sentimento foi outro: curiosidade. Um estica os olhos lá pra dentro, outro chega junto, fica na ponta dos pés para ver a cena. Fantástico. Nunca viram uma roda como aquela. A trilha sonora não era outra. O pancadão do Break hipnotiza! Cada um faz seu gesto, acompanha o ritmo, parado ninguém fica. Na pista, um imita robô, quebrando o movimento em quadros ritmados. Outro mais parece o homem-borracha, entorta os pés pra trás, destronca os ombros, se desfaz como ser humano. Um mais parrudo inicia sua série, em rodopios de deixar os olhos vesgos. A cada Bboy, uma bossa, um jeito, o sorriso no rosto e o desafio na roda. Até o romper da madrugada, o clarear do dia. Sem brigas, só no divertimento. O desafio é contagiante e nós, mortais, podemos apenas assistir ao espetáculo do Hip Hop.
Poucos entenderiam... Assim tão tarde? Por que não mais cedo? É o estilo. São as sobras dos bailes, na produção 0800. Sem dinheiro, o Hip Hop depende apenas da vontade, da disposição de conversar, dialogar e conquistar seu espaço. Faz sua entrada no fim da festa, quando o público não está mais para exigências e o dono do recinto libera. A noite toda no aguardo para aquele instante de brilho. A madrugada é o fundamento, uma tomada de liberdade, para o verso afiado dos MC’s e para o fluir da expressão corporal, o desconcertante bailado dos B-Boys. Enquanto as horas não passam, a roda é apenas um projeto, um pensamento. A trupe do hip hop vive sua informalidade neste tempo livre, seus namoros sinceros, seu rolé pela multidão. Só onda. Bate o sino e os trabalhos começam, com a roda armada até o primeiro raio de sol. Os olhos já não suportam, o cansaço é grande, mas a felicidade estampada na face e, finalmente, os ônibus voltam a circular.
A condução amiga leva de volta pra casa os tipos do hip hop. Jovens de moradas distantes, boa parte reside em favelas perigosas, onde a madrugada não é nada receptiva. Fazer o quê? Aguarda-se o amanhecer e está tudo bem. A noite valeu. Foi sadia, cheia de encontros e no banco do buzão o corpo descansa o Power Move caprichado. Para quem viu a roda de break, talvez não tenha percebido a complexidade do trabalho de solo. Os códigos internos se revelam aos leigos como a visão de um palhaço, hilário, sacana e desafiador. Esconde as horas de treino, dedicação e paixão pela atividade física, o bailado híper-elaborado.
Na arena, uma coreografia pode ser destrinchada, pela interpretação de personagens, pela divisão nos planos cênicos do desafio. O desafio em correria, no ritmo das batidas, no up rock, é feito de pé no plano mais alto. No plano médio, o foot work embaralhou as vistas: um sapateado, uma cruzada de pernas para cá, volta pro lado de lá num giro radical, um salto e acontece uma paradinha clássica – só alegria. Terminou? Nada. O frenesi continua, desafio após desafio. Entra na série de giros, spins com a cabeça no chão, flares em bananeiras rodopiantes, saltos mortais terminados em posição de morto. O B-Boy faz aquela graça, poses cômicas refreiam as espirais, nos cliques das câmeras caretas e gargalhadas, no plano mais baixo, já deitado na pista. Uma pessoa de fora até se pergunta se aquilo não é o circo. Não. É o desafio. É a pista, arena intensa da gangue dos B-Boys.
Deste pequeno passeio por uma das nights do hip hop carioca ficam algumas lições de vida. Não se trata de ser puritano, dizer que algumas cervejas não foram bebidas, mas... Muito certo, a vida noturna ali possui outro sentido. A idéia de ser bacana, tirar onda, desfilar, namorar – essa existe em qualquer tempo, qualquer classe. O detalhe está no consumismo, que parece estar escrito na primeira linha das baladas. O B-Boy não consome nem deixa de consumir, mas o espírito altivo, a mente sadia, o sangue limpo – são exigências naturais para a dança do break. Sua intensidade.
Com todas as explicações, com todo interesse pela cultura norte-americana, nada mais justo sublinhar o B-Boy brasileiro: favelado, pouca grana e uma bruta opção pela saúde. Isso é onda. O resto é estética e vontade de festa. Do tênis mais caro ao mais barato. Do jogging importado ao moleton de camelô. Bonés e bandanas protegem mais os cabelos do que a cabeça
Escrevemos e tudo que se escreve parece querer explicar o mundo. Basta ter calma e olhar pela janela. O que vemos? Vemos a fome na África? Vemos os mendigos pelas calçadas? As milhares de favelas? Não. O olhar viciado vê apenas coisas boas: bairros nobres, belas praias, as luzes dos shopping center’s, roupas da moda, relógios de ouro, carros importados. Mulheres peruas e homens na beca – é a moda. Pensamos nos lugares chiques e nos esquecemos para que serve aquele segurança grandão na portaria. É para sua segurança, claro. Bota o bandido para correr, impede a entrada de pessoas “estranhas”. Referências de consumo que influenciam a noção de bem estar de cada ser urbano. Excesso de cerveja não combina com direção, mas saimos de carro para “curtir a noite” e a mistureba acaba sendo óbvia.
A propaganda não obriga ninguém ao consumo, mas insinua, instiga. Os lugares tendem ao clichê, molda comportamentos, consensos e casos típicos. Não aceitaremos um índio peladão no centro da cidade, nem queremos suas explicações para essa “agressão visual”. Vemos um bêbado na direção e estará tudo bem, normal e calmo. É mais um, um tipo clichê, fazendo cena num lugar onde se é de esperar. Olha o B-boy ali! – e os seguranças na ronda vão logo encarando, achando que é bandido. É pobre, pele escura, em roupa de baile, que para ele é bonita – e só. Por tudo isso, a atitude do B-Boy é diferenciada.
O quadro mostra uma paisagem e nela o B-Boy é só mais um tipo urbano. A calçada da fama oferece a opção de lazer, de consumo e passividade. Distante de ser um robotizado, andróide do sistema, o hiphop-man se vale da liberdade de expressão para atualizar a cidade. Uma série de histórias malditas, de chacinas, amigos perdidos, parentes mortos, são casos recorrentes numa urbanidade lado B – e o hip hop representa pela baixa renda. São contos de favela, histórias de pessoas esquecidas pelas políticas públicas. Não é a primeira, nem será a última vez em que vamos tratar do assunto. A especulação imobiliária na urbe e o latifúndio de exportação, no campo, retiram do brasileiro de baixa renda sua oportunidade de viver com dignidade. É uma indústria de favelas que, para existir, basta estar vivo e ser do povão.
O pica-pau leva uma cacetada na cabeça e fica louco. Leva uma segunda paulada e volta ao normal rapidinho. É Freud, pai da psicologia. Alguém já disse: psicólogo de pobre é pau. Opa! Surge o hip hop de novo, para falar dessa tragédia toda, fala da parte do jornal que coloca bandido e favelado no mesmo saco. Generalizações sempre assombram, botam a auto-estima no chão. Estão na raiz do racismo: o desprezo pela cor escura, o xingamento verbal, a preferência étnica-estética no ambiente de trabalho e acompanha parte da violência, em batidas policiais desmedidas. Na voz rasgada do MC, na mistura de sons do DJ, referências realistas do dia-a-dia brotam em favor da cura. No bailado complicado o caos urbano ganha seu palco popular. O B-Boy tira dos tiques nervosos, do cambalear dos bêbados, dos gestos de violência, das cartas de amor, da robotização do trabalhador ou do escape ao cotidiano: a dança multiforme da urbe ingressa nos passos do break.
Nas áreas do centro, nas áreas nobres, um bando se aproxima
A percepção da vida urbana é em tempo real. Não há tempo para devaneios. Pensamos no saber, no conhecimento acumulado, e buscamos a Ciência para explicar coisas simples. O raio caiu e não passa de um raio. A força da gravidade, a lei de Isaack Newton, não explica a dureza do chão, nem a deformação da matéria. Como lidar melhor com o chão? Com o chão não se briga. A matéria é sólida, mas se bater no chão, ela se espatifa, quebra
No apartamento o código é de controle, universo infantil classe média super-protegido. É da favela? A criança não tem outro lugar e a atitude é fração de segundos. A pedrada é mais certeira, a pipa sobe feito mágica, o batuque não perde compasso e futebol não precisa de escolinha. O sobe e desce em correria gera cicatrizes, fraturas, marcas de quem conhece a altura da lajes, o íngreme das escadas, as tábuas meio soltas e cacos de vidro pelo chão. Logo isso acaba e ganha o asfalto. Precisa ir pra rua, trabalhar cedo, se virar. Tudo isso faz parte do verdadeiro B-Boy.
Como um ninja, o B-Boy sobrevive: corre entre os carros, desvia de balas perdidas. Traz até os centros urbanos o melhor de suas habilidades, numa expressão corporal plena de sincronias. A sensualidade do funk brasileiro, que é um derivado do hip hop, pode até ser imaginada como outra coisa, uma espécie de prostituição. Não é. Brota das páginas da história, vem do folclore profundo, dos terreiros de macumba, das festas das colheitas, das procissões para os santos católicos, do boi pintadinho – enganam as vistas. Uma antropologia da dança escorre e deságua, transformando as modas estrangeiras num meio para sermos nós mesmos. Nossas misturas raciais, nossa antropofagia, nosso hip hop bem brasileiro em sincronia com o mundo.
João Saldanha, clássico comentarista de futebol, sempre criticou arquitetos como Oscar Niemayer ou Lúcio Costa, que não incluíram nos projetos urbanos áreas de lazer adequadas. Como eram os campos de várzea, de onde saíram muitos craques da Copa de 70. Nas categorias de base, uma mini-seleção é criada, enquanto o esporte ainda é brincadeira. Da tradição medieval, a falta de consideração com a criança brasileira deturpa, não apenas sua necessária paisagem lúdica, mas afeta o próprio profissionalismo do futebol. Daí, o estigma do jogador como moleque. Aquele menino que termina jogando bola na rua, rente aos carros, na maior alegria. Um perigo - a pelota rola no trânsito. O moleque troca fácil sua vida pela bola.
A cultura hiphop é uma adaptação às limitações do espaço urbano. É feito das ruas, sem play-ground, pelas calçadas, esquinas – o mesmo meio de onde brotam as gangues. Distante de ser um mal interior, o crescimento na adolescência, o início da fase adulta, exige uma paisagem psicológica especial, lúdica e labiríntica. Não é apenas biológica, como avanço da idade, mas uma etapa cultural, sensorial, aventureira e natural. É o momento do Fauno solto pelas florestas, desafiar os deuses e perseguir minotauros, capturar princesas – uma tomada erótica do mundo. Infelizmente, vivemos um mundo despido de erotismos e aventuras sadias, inclusive pela precariedade e/ou escassez de parques, campos de João Saldanha, matas e bosques. A indústria pressiona, puxa a mitologia interna dos garotos pobres para o comércio gangster, sustentado em armas, muambas, drogas, símbolos de poder num mundo artificial, num labirinto urbano.
A natureza da dança sustenta um elo fundamental com as batidas do coração, com o pulsar da vida, com a imitação dos animais, a fertilidade do solo, os ciclos da lua e do sol. Tudo isso vem sendo reduzido como paisagem natural, sendo acimentado, difamado, confinado. Alguns sambistas históricos sofreram com a repressão policial, em relatos sobre pandeiros apreendidos, violões quebrados. O samba perdeu parte de seu espaço comunitário e hoje, paga-se caro para ver um bom samba, numa casa de shows. Não é mais tão ao ar livre, sincero como já foi. Rio de Janeiro, cidade maravilhosa, isso foi só até a década de 50, antes de uma gigantesca migração campo-cidade, enquanto o meio rural ainda era sustentável para o agricultor. As máquinas substituem esforços, braços, reduz o trabalho ao aperto de botões. Desemprega, subutiliza.
Uma grande cidade toma a forma do inchaço, com elevados índices de desocupados. Como se fosse bonito ter mais habitantes de que Nova Yorque, se a multidão fosse vantagem para São Paulo, Hong Kong, ou Ciudad del Mexico. Pobre Nova Yorque. Sob a especulação imobiliária, uma série de incêndios criminosos e reformas urbanas intermináveis fizeram do bairro do Bronx e adjacências um lugar bastante ruim para se viver. Estamos nos anos de 1970-80 e a globalização da música norte-americana já é um fato, segmentando-se através da world music, a fusão de ritmos de outros países com o rock/jazz. Internamente, o racismo motivou um segmento black-music. Políticos fundamentalistas dos Estados Unidos tratavam da segmentação “Black” como problema social, o gueto – o perigo negro.
Contraditória, a democracia parece incentivar “os perigos” através da liberdade de expressão. Um perigo estético, dado pela sensualidade provocativa do funk. Perigo também dado pelo discurso combativo dos líderes Malcom X, por sua seriedade islâmica, e Martin Luther King, por sua seriedade protestante, ambos assassinados. Mesmo mortos, ainda causavam alguma preocupação política. A solução para dar fim ao clima de revolta popular foi a liberação do crack, droga terrível. Consome o ser humano, esgota suas economias e faz um ladrão mais violento. Pior. Uma guerra de gangues se renova, depois de Capone e gangsters clássicos, pondo jovens negros e latinos em conflitos sem fim, obedientes a hierarquia das ruas – os traficantes, de um lado; a polícia, de outro. Era o Bronx, lado B de Nova Yorque, cuja trilha sonora era o Funk.
A música globalizava-se pelas ondas dos rádios, pela popularização das vitrolas e pequenas gravadoras. A Island Record lançou Bob Marley, com seu reggae envolvente, seu ska. A musica norte-americana tocada com acento jamaicano ganhou toda uma juventude libertária, colocando o país no mapa musical definitivamente. Misto de referências, na urbe jamaicana aconteciam bailes ao ar livre, nas radiolas festivas, sound systems, dos poetas, das melôs em acentos e traduções locais. O grupo americano Tag Team, que lançou "Whoop, there it is!" (Oba! É isso aí!), o povo no baile traduziu para "uh! tererê" - é o poder da melô, nos sound systems. Foi a bagagem cultural do jamaicano e discotecário, DJ Kool Herc, radicado no Bronx. Disc Jockey original, usou dois discos iguais para extrair apenas a batida do funk, o ritmo sem as canções, alternando as vitrolas. Uma hábil manobra, que não impedia a quebra do ritmo – inventou o Break. Técnica que depois enfrentou a concorrência das batidas programadas, do aparelho eletrônico 808. Mas o funk continuou como base e os advogados de James Brown até hoje reclamam direitos autorais...
Convidados para acompanhar a discotecagem, Coke-la-Rock e Clark Kent passaram a recitar poemas no microfone, dentro da batida do break. Foram os primeiros Mestres de Cerimônias, ou MC’s. Esta oralidade no hip hop é conhecida como RAP, ou ritmo e poesia em português, essencial na reconstrução da identidade dos jovens do gueto. Outro garoto, Grandwizard Theodor, como o brincar de uma criança, empurra o disco com os dedos e na agulha surge o scratch: inventou uma técnica de toca-discos fundamental no hip hop. James Brown estourou com o funk em 1968 e, com sua alegria contagiante, seu ritmo e danças amalucadas fizeram muito sucesso no Harlem, famoso bairro negro. Brown foi aclamado pela intelectualidade negra. Seu estilo “de negão” fez sucesso através dos tempos, influenciou militantes afro-americanos, leitores críticos e colecionadores de discos – como o DJ Afrika Bambata. Por lá, EUA, os toca-discos não são tão caros e uma boa fatia dos mais pobres pode adquirir a belezura. Por aqui? numdigonada... e viva o mp3!
A competição é um traço marcante da cultura norte-americana e isso incluiu os DJ’s. Nomes como DJ Grandmaster Flash, Bobby Robinson, Kool Herc e Afrika Bambata fizeram inúmeras batalhas de DJ pelas ruas (Block Party). Bambata, além de Disc Jockey, é um estudioso afro-americano. A ginástica de performance é expressão corporal difundida nas escolas nesta época e teve espaço nas manifestações políticas, nos parques de Nova Yorque. Tirando idéias da história afro-americana, Bambata formou um grupo de dança voltado para o hip hop, com cinco participantes, denominado Universal Zulu Nation. Deste impulso em diante, a turma toda captou o espírito e todos os dias um novo grupo de hip hop (Break Crew) aparecia: Kool Herc & the Herculoids, The Nigga Twins, The Zulu Kings, The Seven Deadly Sinners, Shanghai Brothers, The Bronx Boys, Rockwell Association, Starchild
O spray foi anunciado como praticidade para a pintura doméstica, mas entrou nos códigos da molecada. Turbinou certos avisos afirmativos, populares, que expressam guerras e sexo. Recados de porta de banheiro. Misturados com o estilo do desenho das histórias em quadrinhos (HQ), que dominavam a literatura juvenil, com super-heróis, ou tiragens de HQs adultas, como as de Robert Crumb – captavam de tudo. O homem na lua, o aparthaid na África do Sul, a guerra do Vietnam, a luta contra o racismo – tudo isso potencializou a estética do Grafiti. Tag 175, garoto jamais encontrado, foi compulsivo em suas marcações de territórios e influenciou os demais numa competição. Daí em diante, a evolução foi natural: passou da quantidade de assinaturas para a dificuldade de produzí-las, enfrentando obstáculos, como alturas intangíveis, mas finalmente ganhando a forma artística das HQ’s. Vemos com alegria a decoração urbana, a ilustração mural, os trens coloridos, o incrível Hulk num banner de prédio inteiro: é o Grafiti.
Momento histórico das bandeiras de luta – política libertária, movimentos sociais e arte – a performance da Zulu Nation fez o B-boy brilhar. Nação é uma referência histórica sobre os escravos, trazidos de territórios específicos na África, nações angola, monjolo, cabinda etc.. Zulu, pois uma homenagem a uma tribo africana mostrada em um filme, parte de seus interesses "afro". A Zulu Nation se espalhou pelo mundo, através de coligações, e no Brasil também está representada. Desde 1992, Nino Brown coordena sua atividade na Grande São Paulo, irmanado com Afrika Bambata, que veio ao país pela quarta vez em 2008.
Sai de seu impulso militante uma importante contribuição que reavivou o espírito de luta. Mitos políticos recentes, Martin Luther King por exemplo, fragmentos dos discursos passaram pelas pick ups dos DJ's nas festas de rua. O Hip Hop rodou o globo e influenciou na discussão do racismo em países onde o assunto ainda era tabu. Na televisão, nos cinemas, o B-Boy como astro internacional mesmo. Num exemplo mais Pop, Michael Jackson foi o ícone mais reverenciado na dança B-Boy e, no Brasil, foram muitos os bebezinhos Maicons, batizados em sua homenagem. O Break não é uniforme, varia em ritmo e conteúdo discursivo. Passa pela sensualidade do Miame Bass e do Funk Brasil, como pela inocência romântica do Funky Melody. Através da agressividade do Hard-Hop, do Gangsta´Rap, um alerta perturba a classe média, fala sobre a deficiência das instituições de securidade social, o alastramento dos guetos pela urbanidade. A identidade hip hop fortalece o espírito solidário, numa reunificação gueto-cidade. O Hip Hop faz a ponte entre a Favela e os Bairros Nobres, sua criatividade underground no Mundo, em letras garrafais, matéria de capa nos melhores jornais.
A variedade de técnicas de expressão corporal e dança acumulou-se em linhas principais, denominadas Breaking, Up-Rocking, Popping, Locking, mas por natureza o estilo é livre. Se a imitação de uma cultura externa tem seu valor, no hip hop isso ganha letras maiúsculas. O break trata do brinquedo infantil, da evolução técnica, do espelho de sua personalidade, sua história e se transforma em uma clara posição política diante de um mundo violento. Não foi do nada que o hip hop entrou feito chiclete na boca do povo, soprou e fez bola: na dança do B-Boy.
Todo mundo aê! Mãos pra cima!
Desencosta da parede e pode bailar!
Bem vindos ao bailado do Break!
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